É possível pensar numa ética de desenvolvimento ou em um desenvolvimento ético? Que valores humanos deveriam emergir dai?
O homem chega ao final do século contabilizando resultados
altamente questionáveis. O modelo de desenvolvimento baseado no uso de
recursos naturais não renováveis começa a apresentar sinais de exaustão,
levando as principais sociedades do planeta a uma mudança drástica das grandes
referências que determinaram suas metas. O novo modelo exige uma mudança
das políticas globais e o estabelecimento de um novo paradigma tecnológico,
econômico e jurídico.
Desde 1972 quando as Nações Unidas realizaram a Primeira
Conferência Mundial sobre Meio Ambiente em Estocolmo, até 1992, com a
realização da Segunda Conferência, a Rio-92, o homem mudou muito sua maneira
de tratar, usar e considerar os recursos naturais. Embora todos reconheçamos
que o desenvolvimento é uma meta desejada e necessária, nos últimos anos
cresceu a preocupação de buscar um desenvolvimento sustentado e eqüitativo,
que preserve a qualidade de vida das presentes e futuras gerações. Conseguir um
desenvolvimento sustentado e eqüitativo é hoje o maior desafio da raça humana.
Como observa José Afonso da Silva,1 o desenvolvimento
econômico tem consistido, para a cultura ocidental, na aplicação direta de toda a
tecnologia gerada pelo homem no sentido de criar formas de substituir o que é
oferecido pela natureza, com vistas, no mais das vezes, à obtenção de lucro.
Em 2.030, a produção mundial será equivalente a 3.5 vezes o
nível atual, ou cerca de 69 trilhões de dólares. Se a poluição e a deterioração
ambiental aumentarem na mesma proporção do crescimento da produção, os
problemas resultantes serão terríveis.
Urge uma revisão profunda da ordem econômica, social e política
e a formulação de um novo paradigma de valores.
É de vital importância para a sobrevivência da humanidade. O
sistema natural não pode mais ser analisado, apenas, sob a ótica das ciências
naturais; sua preservação exige um estudo também sob a ótica da ciência social.
Impõe-se uma visão holística do meio ambiente, que deve ser considerado como
um todo, exigindo dos agentes econômicos e dos formuladores de políticas
públicas, uma nova postura.
Já se disse que onde começa a economia termina a ética. Que a
ciência econômica, na análise do fato econômico e das variáveis econômicas
não pode admitir a inserção de valores. A única preocupação da economia
1 Direito Ambiental Constitucional, 2ª edição, São Paulo, Malheiros, 1995,
consistiria na geração e distribuição de riquezas através da agregação da
produção de bens e serviços de consumo. Ramón Martin Mateo observa:
a teoria do valor e a lógica espontânea dos mecanismos de mercado como
sistema de otimização das decisões econômicas constituem pedras
angulares do sistema econômico ocidental, respondendo a sua filosofia
básica centrada na liberdade e no pluralismo. Neste contexto a utilização
dos recursos naturais se apoia simplesmente na fixação de preços
competitivos quando estes são escassos e se apropriam privadamente. Na
economia liberal encontra-se dificuldades apara a instrumentação de
medidas limitadoras da denunciada exaustão dos recursos se os preços
não se alteram, como é normal, diante da fronteira de escassez, que no
entanto se apresentam distantes.
Durante décadas essa visão liberal de um desenvolvimento a todo
custo, baseado no uso de recursos naturais, dominou o ocidente, resultando na
prosperidade de povos e países. Neste final de século, economistas aliam-se aos
profissionais das ciências naturais e sociais, para formular um novo modelo
econômico que permita o desenvolvimento sem comprometer as gerações futuras.
Isto responde a uma conclusão do Banco Mundial de 1992, denominada
Desenvolvimento e Meio Ambiente – Indicadores de Desenvolvimento
Mundial:
Não há nenhuma diferença entre as metas da política de desenvolvimento
e as de uma proteção adequada do meio ambiente. Ambas devem ser
concebidas com a visão de melhorar o bem estar.3
Dentro dessa nova visão, a atividade econômica encontra
limitações no Direito que, a partir de indicadores formulados pelas ciências
naturais, passa a tutelar um novo interesse, que pode não ser público mas é
detentor de uma alma pública: é o interesse difuso que reúne pessoas ligadas
entre si por uma situação de fato.
Assim, a atividade econômica encontra limitações ditadas pelas
exigências de respeito a um novo direito, de terceira geração, elevado ao nível
constitucional que é o Direito Ambiental.
Esta nova economia, amalgamada a este novo direito, propõe a
formulação de uma nova ordem econômica mundial. A sociedade globalizada,
ligada por uma formidável revolução nas comunicações, internacionaliza o debate
dos problemas econômicos e estabelece novos contornos para a determinação de
valores.
O conceito de desenvolvimento sustentável tem se constituído
parte importante do debate mundial.
A Agenda 21, elaborada durante a Conferência das Nações
Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, realizada no Rio de Janeiro
em junho de 1992, articula com clareza a necessidade de se integrar o meio
ambiente com o desenvolvimento.4
Instituições de expressão internacional, como o Banco Mundial,
também adotaram o conceito de desenvolvimento sustentável. As futuras
atividades do Banco Mundial, incluindo empréstimos, ajuda, regulamentação,
diálogo sobre políticas, assistência técnica e pesquisa têm considerado a variável
ambiental na análise de seus projetos, bem como, avaliado a adoção de suas
recomendações.
esta postura a principal entidade financeira mundial,
apresentou ao mundo sua visão de desenvolvimento. O apoio financeiro e técnico
internacional terá papel importante no esforço para se conseguir o
desenvolvimento sustentável. Tanto é que o Banco Mundial tem adotado uma
postura bastante rígida em relação à preservação ambiental, exigindo, inclusive de
organismos públicos e até mesmo de países, o cumprimento de normas ditadas
pela nova ordem econômica mundial, que não abre mão da preservação do meio
ambiente.
2. A Transformação dos Valores Ambientais e a Nova Ordem Social
A conscientização ambiental exige uma nova postura da
sociedade, bem como uma revisão profunda de várias ciências.
O meio ambiente, que até aqui vinha sendo tratado pelas ciências
naturais, passa a assumir uma visão multidisciplinar, exigindo de juristas,
economistas, pedagogos, sociólogos, psicólogos, arquitetos, urbanistas,
economistas, e formuladores de políticas públicas uma nova postura e um novo
enfoque no trato da questão ambiental.
A ciência econômica terá o grande desafio de rever seus
princípios básicos e as relações entre o homem e natureza, integrando a
introdução de valores em bens naturais, até aqui não considerados
economicamente, bem como, analisando as questões urbanas, agora com o
enfoque não apenas de geração de riquezas para a satisfação de necessidades
individuais, mas na busca de um desenvolvimento sustentado. Impõe-se a
proteção do meio ambiente como parte integrante do desenvolvimento. Sem uma
proteção adequada do meio ambiente, o desenvolvimento será prejudicado, sem
desenvolvimento os recursos serão inadequados para os investimentos
necessários. É o que preconiza o desenvolvimento sustentável, conceito
explicitado assim: satisfazer as necessidades da geração atual sem comprometer
as necessidades das gerações futuras. Impõe-se pois, um balanço, um equilíbrio
entre economia e ecologia.
Embora todos reconheçam que o desenvolvimento é uma meta
desejável, nos últimos anos cresceu a preocupação em saber se as limitações
ambientais virão a restringi-lo e se o desenvolvimento causará graves danos ao
meio ambiente prejudicando a qualidade de vida desta e das futuras gerações.
Conseguir um desenvolvimento sustentado e eqüitativo continua
sendo o maior desafio da raça humana.
Apesar do progresso registrado desde a última geração mais de 1
bilhão de pessoas ainda vivem em extrema pobreza, sem acesso aos recursos de
educação, saúde, infra-estrutura, terra e crédito. A tarefa essencial do
desenvolvimento é propiciar oportunidades para que essas pessoas e para outras
centenas de milhões que se encontram em condições não muito diferentes,
precariamente assistidas possam desenvolver seu potencial humano.
O novo paradigma tecnológico e econômico vai exigir, pois, uma
revisão profunda na ordem econômica e social.
O conceito de capital da natureza, que é distinto daquele
fabricado pelo homem, o que torna mais complexas as funções de produção,
ainda que as tornem mais realistas.
Este conceito de desenvolvimento sustentado deve ser entendido
como o significado de melhorar a qualidade de vida humana dentro dos limites da
capacidade de suporte dos ecossistemas do nosso planeta.
Para viabilizar o crescimento sustentado, de acordo com as
exigências da natureza, é necessário garantir um vínculo entre a política ambiental
e econômica em todos os níveis de governo e em todos os setores da economia.
3. O Desenvolvimento Sustentável
Soados todos os sinais de alerta o homem toma conhecimento do
esgotamento do modelo econômico, e passa a ter uma preocupação real com as
gerações futuras.
Dentro da visão multidisciplinar, sistêmica e holística da questão
ambiental, os mais diversos ramos do conhecimento passam a construir os
princípios básicos de uma sociedade sustentável.
Um estudo patrocinado por importantes organizações
internacionais, denominado Cuidando do Planeta Terra – Uma Estratégia para o
Futuro da Vida,6 elaborou os princípios da vida sustentável e destaca que:
Viver de forma sustentável depende da aceitação do dever da busca de
harmonia com as outras pessoas e com a natureza. As regras básicas são
de que as pessoas devem compartilhar e cuidar do Planeta Terra. A
humanidade não deve tomar da natureza mais do que a natureza pode
repor. Isto, por sua vez, significa a adoção de estilos de vida e caminhos
para o desenvolvimento que respeitem e funcionem dentro dos limites da
natureza. Pode se fazê-lo sem rejeitar os muitos benefícios trazidos pela
tecnologia moderna, contanto que também a tecnologia funcione dentro
de tais limites. Esta estratégia trata de um novo enfoque do futuro e não
de uma volta ao passado
O trabalho mencionado elenca como princípios da sociedade
sustentável os seguintes:
• respeitar e cuidar da comunidade dos seres vivos;
• melhorar a qualidade da vida humana;
• conservar a vitalidade a diversidade do Planeta Terra.
O respeito à comunidade dos seres vivos reflete o dever de
preocupação com todas as formas de vida. Trata-se de um princípio ético que
quer significar que o desenvolvimento não pode acontecer em detrimento das
gerações futuras. Este respeito significa que toda a vida no Planeta é
interdependente, não sendo possível discriminarmos formas de vida, ou
localização geográfica de populações de qualquer espécie. É condenável, então, a
chamada ética de fronteira, que permite especialmente a empresas multinacionais
e transnacionais, fora de seu território de origem, a liberdade para agir não
observando valores, regras, leis e convenções que observam em seus países.
Resultam daí grandes agressões ecológicas em todo o mundo. A ética de fronteira
tem permitido que tais empresas vendam produtos cuja fabricação e
comercialização constitui crime em seus países, que se utilizem de expedientes
ilegais como corrupção de autoridades e dirigentes de países, notadamente os de
terceiro mundo. Não é admissível a venda de agrotóxicos altamente nocivos,
proibidos nos países de origem, porém comercializados por empresas em outros
países com nível de exigência mais baixo; ou a venda de alimentos vencidos em
aíses que não exigem o controle de validade de tais produtos; ou o despejo de
lixo tóxico em países sem legislação específica a respeito; ou o caso das
indústrias do fumo que recentemente produziram uma planta geneticamente
modificada como maior teor de nicotina para forçar a dependência dos fumantes.
É inadmissível, ainda, que experiências genéticas com a introdução de genes,
vírus, plantas geneticamente modificadas e experimentos similares, proibidos por
força dos níveis de exigência de responsabilidade civil em seus países de origem,
sejam realizados em outros países de baixa exigência legal, por quaisquer
empresas cujo objetivo único é o lucro.
O segundo princípio diz respeito à melhoria da qualidade da vida
humana, que, de resto, vem a ser o grande objetivo do desenvolvimento. Este,
por sua vez, não pode ser um fim em si mesmo, mas apenas um meio de permitir
aos grupos econômicos aumentarem seus lucros.
A melhoria da qualidade de vida da população passa por uma
ampliação da expectativa de vida, pelo acesso à educação e aos recursos
necessários para um padrão de vida digno, pela liberdade política, pela garantia
de direitos humanos e proteção contra a violência. É inadmissível a realidade do
mundo, onde pessoas ainda são escravizadas pelo analfabetismo e pelo
desemprego.
A deterioração do meio ambiente, indiscutivelmente, afeta a
qualidade de vida da população em geral. E a pobreza, a miséria, são os
indicadores mais explícitos da má qualidade de vida. Entretanto, acabam por
ensejar uma questão: nos países pobres, as normas de preservação ambiental
seriam de interesse da população, quando limitam a atividade econômica? Como
fica a posição da população miserável no confronto entre a proteção ambiental e o
emprego?
A pobreza e a miséria vêm se concentrando nos países de terceiro
mundo, notadamente na América Latina onde o número de pobres, na década de
90, chega a mais de 200 milhões de pessoas, 50% maior do que 1960. Dados
comprovam carências básicas: 40% dos lares não recebem o mínimo de calorias
considerado indispensável; dos 12 milhões de bebês nascidos por ano, mais de
700 mil morrem antes de completarem um ano de idade; o índice de abandono no
ensino de escolas primárias é de 15% (mais alto do que na África e Ásia).8
A melhoria da qualidade de vida passa, assim, pela superação da
pobreza como meio de chegar à verdadeira igualdade e permitir que as pessoas
possam defender a preservação ambiental, sem ter a preocupação com sua
sobrevivência física, determinada pela maior ou menor oferta de emprego e renda.
O terceiro princípio diz respeito à conservação da vitalidade e a
diversidade do Planeta Terra.
A vida sustentável exige mais do que o respeito ao homem e à
sua sadia qualidade vida. Com efeito, é necessário manter a capacidade de
adaptação dos ecossistemas e das comunidades humanas que deles dependem,
adequando a produtividade à capacidade de rápida recuperação e mantendo a
variedade da biosfera. É primordial, então, a conservação dos sistemas de
sustentação da vida fornecidos pela natureza, ou seja, a manutenção dos
processos ecológicos que determinam o clima, limpam o ar e a água, regulam o
fluxo de água, reciclam os elementos essenciais, criam e regeneram o solo e
mantém o planeta adequado à vida.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Um comentário:
Hehehehe... concordo com vc Gabi. O problema do desenvolvimento sustentável foi, é e será sempre o "x" da questão. Afinal, o meio ambiente é único, as espécies são únicas. Como pode-se dizer que vai derrubar 10 árvores e plantar 1000... ? E as 10 que foram derrubadas...? E a biodiversidade que dependia dela...? O desenvolvimento sustentável é o nome bonito que arrumaram pra: Destruam a natureza, mas com responsabilidade.
Grande Beijo Gabizinha !! Sucesso !! Vc é 1000 !!!
Postar um comentário